Entrevista - Beto Brito

sexta-feira, 23 de outubro de 2009


Significado da palavra “bazófia”, segundo o dicionário: impostura, fanfarrice, prosápia. O sujeito que faz, fala, ou canta bazófia, grita aos mundos feitos muito maiores que a realidade. E se na arte o aumentado e o real se confundem, o ponto de interrogação pesa ainda mais quando falamos de “Bazófias”, o novo trabalho do cordelista e rabequeiro piauiense Beto Brito.
Com três álbuns lançados, o artista firmou-se guiando o primo rústico do violino, a rabeca. Ele nasceu em Santo Antônio do Lisboa, no sul do estado. Distanciado da natal por 26 anos, mora em João Pessoa, na Paraíba.
Beto Brito aproxima de sua música todos os componentes que identificam suas raízes. O nordestino está ali, sempre no cordel, mas com uma roupagem diferente. O novo álbum está em plena fase de produção.
Vestindo completamente o personagem, Beto Brito, por email e na “peleja”, concedeu entrevista exclusiva ao Apolo News sobre seu projeto, carreira e idéias. Tente descobrir o que é verdade, o que é mentira, o que é exagero,  e o que é mais interessante deixar sem resposta.


 
"Bazófias" é o nome do seu novo disco? Pegando um pouco no pé do significado da palavra, seus fãs devem esperar o mais fanfarrão dos trabalhos? Fala um pouco da brincadeira.
Na realidade, Bazófias é o nome do disco e do cordel. Para ser mais completo, se chamará “Bazófias de um cantador pai d´egua- o maior cordel do mundo!” Trata-se de trabalho homérico, com mil e duzentas estrofes em septilha, com muitas tiradas a respeito da minha inesgotável sabedoria. Pelo pouco que eu sei, sou capaz de peripécias que ser algum jamais, foi capaz de se atrever em toda história da humanidade. Bazófias é uma forma de auto-elogio, melhor dizendo, é uma pabulagem. Nos repentes de viola é comum os repentistas iniciarem suas pelejas com uma apresentação para o público, dizendo que sabem de tudo e um pouquinho mais, na tentativa de intimidar o seu oponente e conquistar a simpatia dos presentes.  Ele diz coisas do tipo:
Sou pior do que lacrau, 
Ferroada de arraia
Cacetada na canela
Subida do Himalaia
Paraquedas sem abrir
Quatro dias sem dormir
Duas semanas de vaia

Desfecho duma tocaia
De aranha em mosquito
Sou asfalto esburacado
Queda de meteorito
Fuselagem de foguete
Areia no sabonete
Veneno  no pirulito
Quais participações especiais o trabalho esconde entre suas quinze faixas?

Eu espero ter a companhia de artistas feito Siba Veloso, Silvério Pessoa, B.Negão eGabriel Pensador, porém ainda é muito cedo para tais definições, uma vez que muitos querem participar e, provavelmente, eu faça uma espécie de sorteio... ‘num’ gosto de deixar ninguém decepcionado, né?
Teu site reserva uma definição especial pro último trabalho lançado, Imbolé (2006). “Sem o estereótipo  do  conservadorismo tradicional e imutável”. Como é isso? Você tem a preocupação de incluir novos elementos e roupagens no som e ao mesmo tempo respeitar a tradições, como em uma balança cultural?
 A internet não é apenas o principal meio de divulgação do artista independente, em alguns caso, é o único! O myspace e outros site especializados são  excelentes fontes de ferramentas de veiculação, aliás, dêem uma olhada no “myspace.com/imbole” e vocês poderão conhecer um pouco mais do Imbolê (o meu disco atual) que já conta com quase quarenta mil acessos ao meu perfil. A venda de discos pela internet se resume a uma opção extra para quem deseja adquirir o cd físico, porém anda muito distante de ser uma forma de sobrevivência... a sobrevivência musical continua sendo os shows, as arrecadações de direito autoral e as vendas on line de músicas isoladas. 
O release  do site disponível em cinco línguas diferentes entregam um pouco da tua experiência e reconhecimento fora do país. Pode traduzir  um pouco da estima de estrangeiros sobre seu trabalho através de um relato dos anos de carreira?
É isso mesmo, eu faço minhas comparações musicais da seguinte forma; imagine uma casa de chão batido com  teto solar; um carrinho de madeira equipado com GPS; um aviãzinho de papel com transponder; uma rabeca de tripa de carneiro duelando com uma guitarra distorcida; um cordel escrito em papel de pão com distribuição nacional... inovar não se faz necessário mudar tudo, eu me refiro às minhas primeiras experiências sonoras –que foram no mei-de-feria, nas pelejas de viola, o fole e as rabecas em festas de rua; depois eu juntei com os sons contemporâneos curtido nos anos setenta, até os dias de hoje com as fusões eletrônicas entre cordas e módulos digitais! Sou meio primitivo, meio transcendental... Não mudei nada, adaptei apenas...
Nordeste atravessa sua discografia como base para grande parte das referências. Puxando pelas suas raízes especificas, como o Piauí te influencia?  Saudades, mágoas? Divide uma das tuas lembranças com a gente.
 Posso dividir minhas lembranças com vocês, tenho várias, menos mágoa! Deixei o Piauí de forma espontânea, guiado pelo instinto musical, pela vontade de escrever minha própria história e conquistar o meu espaço. Não posso dizer que sou esquecido pela minha terra, até porque tenho recebido alguns convites para tocar no meu estado, como foi o caso do Festival de Rabecas no mês de setembro na cidade de Bom Jesus, eu culpo a mim mesmo, por não ser tão conhecido ou “reconhecido”, não tenho divulgado meu trabalho como deveria nesta região, mas estou me preparando para isso e quero fazê-lo com mais intensidade nesse começo de ano, até porque será o lançamento do Bazófias e divulgação do Imbolê, que, na minha opinião, é um álbum que ainda tem coisa para ser dita e ouvida. Saudades eu tenho. De vez em quando eu disparo no gatilho veloz das estradas e mato-a com minha presença! 
Você se acha pouco celebrado no Piauí? Como é a relação profissional com o estado natal? 
Essa relação ainda é um pouco tímida, porém acredito que os piauienses, meus conterrâneos, ainda irão se orgulhar de mim, afinal de contas, eu me orgulho muito da minha casa natal, do seu povo, de sua arte e de sua simplicidade! Vou plantando lentamente sob o sol da minha terra, não sei quando irá chover, mas quando isso acontecer, eu quero estar preparado para colher o resultado dos sons tirados das pedras, das cacimbas e dos bichos da minha infância! 




Texto e entrevista: Igor Prado
(igorprado1@hotmail.com) 


0 comentários: